
O que era pra ser um dos dias mais felizes da vida de Vandernilson Abreu virou um pesadelo que já dura quase duas semanas. Morador do rio Moa, em Mâncio Lima, ele é pai da pequena Caila, que nasceu no último dia 23 de julho com uma má formação grave: sem o ânus. O mais revoltante: ninguém no hospital percebeu.
Tudo começou quando a mãe da bebê, Natalina Souza Silva, deu entrada no Hospital Abel Pinheiro, em Mâncio Lima, em trabalho de parto. De lá, foi transferida para a maternidade de Cruzeiro do Sul, onde a bebê nasceu às 20h30, de parto normal. Após o nascimento, Caila foi levada para o setor onde fazem a pesagem e os primeiros exames. Mesmo com toda a equipe médica presente, ninguém notou que a recém-nascida não tinha por onde evacuar. Deram alta para mãe e filha no dia seguinte.
Quem descobriu tudo foi a avó materna, em casa, ao trocar a primeira fralda. “Ela percebeu que a bebê não tinha o buraquinho. Foi um desespero. Voltamos correndo pro hospital. A criança tava fazendo cocô pela vagina”, contou Vandernilson, indignado.

Desde então, a bebê está em estado delicado e precisa urgente de uma cirurgia. O problema é que o sistema de saúde também falhou nisso: Caila segue até hoje esperando por um leito no Hospital da Criança, em Rio Branco. A família afirma que, se o erro não tivesse acontecido lá atrás, a menina já estaria operada e fora de perigo.
“A gente já perdeu dia de serviço, não dorme, vive angustiado. E o pior: correndo risco de perder a nossa filha por erro dos outros. Não é possível que ninguém veja um problema desses na hora do parto. Isso é falta de preparo”, desabafa o pai.

E não é só o caso da Caila que levanta a poeira. Em menos de três meses, a maternidade de Cruzeiro do Sul já é criticada por inúmeros casos de negligência. A pequena Aurora foi queimada com água quente dentro da unidade. Maria Heloísa morreu dias depois de nascer com lesões graves na cabeça, e a família também aponta erro médico. Em maio, Ana Cleide Cruz, grávida e moradora de Mâncio Lima, morreu sentada numa cadeira da recepção esperando atendimento. Ela deixou cinco filhos.
A população, indignada, já apelidou o local de “açougue”. São vidas sendo tratadas como se fossem descartáveis. Gente simples que entra ali confiando no mínimo: que vai ser atendida com respeito, com responsabilidade. E o que recebe? Portas fechadas, omissão e dor.
Enquanto isso, uma recém-nascida luta pra sobreviver a uma falha que nunca deveria ter acontecido.